I
Tentar escrever um poema
é bem difícil
e mais difícil se torna
quando a raiva nos cega o coração
e o cérebro quase se estilhaça
porque as entranhas nos rogam
que assassinemos o amor
II
Oh! Poetas
de tempos imemoriais,
ensinai-me a criar poemas
antes que o meu peito rebente
de tanta ira acumulada,
ensinai-me a escrever um poema
com um gume aguçado como uma navalha
e que de um único golpe
rasgue do baixo-ventre ao coração
o corpo nú do Amor
III
Por entre a bruma do luar,
pelo suor colados
às sombras da noite,
meus assassinos contratados,
armados até aos dentes
com odes e sonetos,
que eu ainda não consegui escrever
deveriam desferir
o mortal e profundo golpe
que assassinaria o Amor
IV
Tenho ódio às coisas pueris
e às falsárias ilusões de esperança,
desprezo conceitos vãos
e palavras-substância sem sentido
e nas auroras flutuantes que finam cada madrugada
tento, para assassinar o Amor
escrever poemas de raiva,
mas desisto – não consigo
V
Oh! Musa,
filha de Vénus e Marte,
dá-me a pomba da inspiração
para que eu faça um poema
que em matéria se transforme,
capaz de arrancar a vida
do peito ainda palpitante
do odiado Amor
VI
Quero,
com um simples grito de poeta
transformar em venenosas
as perfumadas setas de Cupido
e que o mar enraivecido
se desdobre
e em seu leito consiga recolher
todos os amantes
e apóstolos do Amor
VII
Que Neptuno
revolva seus reinos crepitantes
e cada um de seus subditos
se torne
num Cruzado na Santa Guerra que declaro
e que as hordas inimigas se desfaçam
nos rochedos e nas vagas:
esses herois aclamados
VIII
Que cada palavra se afigure
um punhal de mil aceradas laminas
e que Baco
nas orgias dos amantes
os deixe prostrados em tal estado
que um simples verso
deste inacabado poema
os expluda
em polpuda massa estraçalhados
IX
Que sejam como as de Ícaro
- as asas –
usadas pelos amantes em seus voos,
em ínfimos pedaços se desfaçam
e o Egeu se tinja em cores festivas
com seu impuro sangue coagulado
como abrindo aos Argonautas de passagem
um caminho de veludo recoberto
X
Que Sodoma e Gomorra como Fénix
ressurjam das cinzas que geraram
para prova de que o Amor não existe
a não ser
como forma de depravado prazer e gozo
e que fique exposta aos olhos de quantos
utópicos
saudosistamente sentimentais
acreditam ainda
na pureza desse despudorado sentimento
XI
Que “Woodstock” se repita uma só vez
para que o 235 enriquecido
penetre no cálix virginal da molécula
e a “vendetta”de Hiroxima
se consume
e as pétalas da flor assim gerada
se espalhem:
fumo, pedra e ferro retorcido
ao sabor do vento do entardecer
XII
Quero,
Oh! Sublime pensamento,
ressuscitar Jack para que de novo
estripe umas milhentas loucas fêmeas
e que também as amazonas se revoltem
destruindo de todo a virilidade
dos que a usam
numa prece constante ao Deus-Amor
XIII
Que a Atlântida ressurja desses mares.
que as calotes polares se desfigurem
que o Vesuvio expluda indignado
que o Diluvio regresse sem Noé
e que o Sol
pelo buraco do ozono
imole certeiro e ágil
os corações apodrecidos pelo amor
XIV
Quero que todas as virgens apaixonadas
sejam lançadas às mãos do Minotauro
que exorcisarão essa paixão
no meio de gozo, baba e sangue coagulado
e que a Medusa, por seu lado
transforme o coração em pedra fria
mas deixe quente a carne p’ro prazer
dos que se seguirão ao Homem-touro
XV
Que os pombos
se tornem águias assassinas
e em vez de recados entre amantes
transportem em seus bicos acerados
balas, bombas, setas, azagaias...
e distribuam seus mortiferos bilhetes
entre os seres
que inertes de esperança
se deixam subjugar pelo sentimento
XVI
E por fim
quando dele não restar
um mínimo detalhe para o futuro
quando estiver sob a terra húmida e fria
sem que alguem dele se possa recordar.
eu, num cumular de gozo e de prazer
deixarei sobre o seu tumulo uma rosa
junto á pedra sepulcral
que em epitáfio dirá:
“Aqui jaz, assassinado, o Amor”
(VG)
E no final não o assassinaste mas o trituraste incansavelmente...só que O Amor sendo o que é ressuscita no mais morto dos cadávers e incendia o mais puro dos corações.
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